23/03/2008

Falta muito para chegar?

Os trens da nossa infância... Seria apenas uma singela viagem de puma entre São Paulo e Araraquara. Mas minha irmã e eu mal podíamosconter a excitação. Tínhamos pouco mais de um metro de altura e os trens, pra gente, eram inusitadíssimos, coisa da tia Meire Rachou, uma inglesa independente, elegante e magérrima que casara com o irmão de meu avô. Tia Meire sabia até guiar mas gostava mesmo de lembrar das viagens de sua própria infância, quando se desvencilhava de uma rigorosíssima preceptora alemã.

Nós nunca havíamos entrado num vagão e a espera de sentar em poltronas no último carro e poder ver o trilho no chão era a coisa mais excitante de nossos cinco anos de vida. Lembro-me mais da expectativa da viagem, do que do cruzeiro em si. A contagem dos dias na folhinha da empregada (fazíamos um X), a escolha das roupas, a preparação das malas, as recomendações e recomendações de minha avó... e de cada detalhe do trem de nossa imaginação -- tinha camas (!), preceptoras alemãs, ingleses indo e vindo, maçanetas de ouro, indianos, festa a bordo... quantas histórias inventamos. A viagem real foi ótima, embora parecesse não acabar, giramos nas poltronas do puma, lemos gibis na saleta de fumantes (minha avó fumava), almoçamos no vagão-restaurante... mas na imaginação, ah... o trem da tia Mary voava!

Não muito por isso, mas mais pelos imprevistos, evito dizer pra Lulu que vamos viajar. Pelo menos não com antecedência. Dessa vez, não me contive. Estava tão feliz de ter fechado as passagens aéreas baratinhas que dei o serviço inteiro. Estou presa a elas, agora. Às infindáveis (como as crianças perguntam!) questões de Maria Luiza. “Falta muito?”, “Em qual hotel vamos ficar?”, “Posso tomar água-de-coco?”, “O mar vai estar gelado?”, “Aquele avião é o nosso?”, “Vamos comprar uma mala?”, “Mamãe, mamãaaaaaaaaaaaaaaaaaaae, fala comigo!”, “Mãe, a gente pode levar um brinquedinho?”, “Mãe, você não vai esquecer a Julia (boneca de dormir)?”. “Mãe, mas julho está longe?”. “Vou ficar com saudades dos meus amigos?”, etc, etc, etc...

Ah, os trens da infância! Dá pra contê-los?

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